Quando voltei de comprar algo gostoso pra minha mãe comer, a Yuna não estava mais lá. Parece que ela tinha ido embora. Eu não tinha agradecido ela o bastante, e mesmo tendo comprado a comida com o dinheiro da Yuna, também não tinha agradecido por isso.
Quando olhei pra minha mãe e pro Sr. Gentz, eles estavam corados por algum motivo. O que será que aconteceu?
– Hum, Fina, Shuri. Bem… como eu posso dizer isso… vocês gostariam de ter um novo papai?
– Um papai?
Era uma pergunta estranha. Meu pai estava morto.
– Eu não sei. Não lembro muito bem do meu pai, então não sei o que pensar sobre ter outro…
– Eu também não sei – disse Shuri.
O Sr. Gentz coçou a cabeça e olhou pra gente.
– Sua mãe e eu vamos nos casar. Fina, Shuri, vocês nos dariam sua bênção?
– Casar?
– Eu quero me tornar o pai de vocês. Quero proteger vocês três. Acho que não vou ser tão bom quanto aquela garota urso, mas vocês deixariam eu cuidar de vocês?
– Sr. Gentz?
– Fina, Shuri, vocês aceitariam o Gentz como papai? – minha mãe perguntou pra gente.
Eu não entendia muito bem. Mas…
– Se isso for deixar você feliz, mamãe.
Shuri também fez que sim com a cabeça.
– Isso vai me deixar feliz, sim. E eu vou fazer de tudo pra deixar vocês duas felizes também. Hã… obrigado, Fina e Shuri.
O Sr. Gentz abraçou a gente. Ele e a mamãe pareciam felizes mesmo.
Depois disso foi uma bagunça. Minha mãe tentou sair da cama agora que estava melhor, e eu tive que fazer ela deitar de novo, e repetir isso toda vez que ela tentava cozinhar, limpar ou sair. A Yuna disse pra eu garantir que ela descansasse bastante. Pedi pra Shuri ficar de olho nela. Ela parecia feliz de passar tempo com a mamãe.
Papai Gentz estava procurando uma casa onde nós quatro pudéssemos morar juntos. Eu precisava ir me preparando pra mudança, aos poucos.
Alguns dias depois que a mamãe foi curada, encontramos uma casa nova e decidimos nos mudar. Pedi autorização pra Yuna pra minha mãe sair da cama. No dia da mudança, a Yuna ia ajudar também.
Normalmente, mudar de casa leva tempo e custa dinheiro. Teríamos que alugar uma carroça e fazer várias viagens, mas a Yuna conseguia guardar qualquer coisa em sua bolsa sem fundo, não importava o tamanho ou o peso. Quando fomos caçar tigrelobos, fiquei chocada de ver ela tirando a casa dela de dentro da luva e depois colocando de volta.
Como a gente já tinha preparado tudo na casa nova com antecedência, terminamos tudo antes da tarde. Fomos pra casa do Sr. Gentz em seguida. Era um horror. Nem sei se ele já tinha limpado alguma vez. Mamãe ficou super brava. Pediu pra Shuri, Yuna e eu irmos pra casa nova antes dela e deixarmos tudo limpo.
Quando chegamos lá, pedi pra Shuri limpar. A Yuna começou a tirar os móveis e camas. Normalmente precisaríamos de várias pessoas pra levar as camas do primeiro pro segundo andar, mas a Yuna só tirou tudo da luva de urso e pronto. Quando ela terminou, foi pra casa do papai.
Shuri e eu demos o nosso melhor pra limpar a casa nova. Quando o sol começou a se pôr, minha mãe voltou com os outros dois, e começamos a falar de comida. A casa ainda não estava limpa, e a gente não podia cozinhar ali. Quando papai sugeriu que fôssemos comer fora, mamãe ficou brava com ele dizendo que era desperdício de dinheiro.
No fim, a Yuna cuidou da gente e fomos pra casa dela. Por que será que a Yuna é tão gentil?
A gente jantou e acabou dormindo na casa da Yuna. Já que íamos dormir lá e estávamos sujas por causa da mudança, a Yuna deixou a gente tomar banho. A banheira da Yuna era tão grande que nós quatro cabíamos juntas. O papai ficou esperando do lado de fora.
A Yuna era magrinha e delicada, e muito bonita, principalmente o cabelo, que era preto e ia até as costas. Fiquei pensando se o meu também ficaria bonito assim se eu deixasse crescer.
Quando entramos na banheira, começamos a falar de peitos. A Yuna disse que ia ficar tipo “pá, vruuush, pá”. Fiquei curiosa com o que ela quis dizer. Eu queria que o meu peito ficasse do tamanho do da Yuna. Já vi muitos adultos com peitões, mas pareciam atrapalhar um pouco.
Olhei pro meu peito e perguntei pra mamãe:
– Você acha que o meu vai crescer?
Por algum motivo, a Yuna olhou pro peito da mamãe e depois pro meu.
– Você é livre pra sonhar – disse ela.
Mamãe ficou meio brava com isso.
– Não precisa se preocupar. O seu vai crescer, diferente do meu.
– Eu queria que o meu fosse do mesmo tamanho que o da Yuna.
Na hora que eu disse isso, a Yuna me abraçou. Por algum motivo, isso deixou ela feliz.
O papai entrou na banheira depois da gente. Enquanto isso, a gente secava o cabelo. O da Yuna era longo e parecia difícil de secar. Quando eu estava me secando com a toalha, a Yuna tirou uma ferramenta redonda e comprida, de formato estranho. Ela me pediu pra virar de costas, e eu obedeci direitinho. Senti um vento quente soprando atrás de mim. Levei um susto e fiz um barulho esquisito.
A Yuna disse que era uma ferramenta pra secar o cabelo soprando vento quente. O vento era agradável, e meu cabelo secou rapidinho. Depois secamos o da Shuri, depois o da mamãe, e a Yuna secou o dela por último. A Yuna é incrível por ter uma ferramenta tão útil assim.
Logo que terminamos de secar o cabelo, o papai saiu do banho, então decidimos dormir, já que estávamos cansadas da mudança. O papai dormiu sozinho, e eu dormi com a Shuri e a mamãe.
A Yuna falou umas coisas que eu não entendi. Como a mamãe e o papai iam sujar os lençóis se dormissem juntos, ela disse que eles não podiam dormir na mesma cama. Acho que se eles dormirem separados, os lençóis não ficam sujos?
Vou perguntar isso pra mamãe outro dia.
Na manhã seguinte, fui a primeira a acordar. Mamãe e Shuri ainda dormiam. Desci pro primeiro andar bem quietinha. Quando estava fazendo o café da manhã, papai desceu também. Ele comeu antes de todo mundo e foi pro trabalho na guilda, que começa bem cedo.
A Yuna desceu pra ficar no lugar dele. Como eu já tinha terminado de fazer o café, fui acordar as outras. Quando as quatro estávamos comendo juntas, a Yuna me fez uma pergunta estranha.
– Você sabe onde vende ovos?
Será que ela queria dizer ovos de passarinho? Quando falei que não dava pra comprar em loja normal, ela ficou decepcionada. Será que queria tanto assim os ovos?
Depois do café, voltamos pra nossa casa nova pra terminar de arrumar tudo. A Shuri ficou pegando as coisas pequenas, e a mamãe e eu cuidamos das maiores. Teria sido bom se o papai estivesse por perto pra ajudar, mas não dava pra fazer nada. Terminamos de guardar tudo que tínhamos trazido da casa antiga, mas tivemos dificuldades com as coisas do papai, que estavam só jogadas em qualquer caixa.
Todas essas mudanças — a mamãe estar saudável, ter comida boa, ganhar um novo papai — aconteceram por causa da Yuna.