— Bom dia, pessoal.
— Bom dia, Yuna — disse Rulina. (Gil apenas resmungou.) — Está exatamente como os rumores diziam.
— Que rumores? Você mencionou isso ontem também, não foi?
— Nada demais. Só que espalhou-se que “a aventureira urso está abrindo uma loja”, que era uma mansão, que havia enfeites estranhos de urso, um cheiro maravilhoso vindo de dentro, e que as crianças que trabalham aqui se parecem exatamente com você. Coisas assim.
Tudo isso era verdade… mas ouvir em voz alta era estranho.
— O que devemos fazer? — ela perguntou.
— Como expliquei ontem, se aparecerem clientes, por favor, digam que abriremos à tarde. E fiquem de olho para evitar qualquer problema quando a loja abrir. Não acho que alguém machucaria as crianças, mas melhor prevenir.
— Justo. Temos o Gil aqui, então duvido que alguém vá confrontar a gente. E se forem, uma encarada do nosso cara resolve. — Rulina deu um tapão nas costas musculosas de Gil. Ela bateu forte, mas ele nem se mexeu.
— Mas ainda são clientes, então, por favor, não… espantem eles.
— Relaxa. Não civis. Só vamos intimidar um pouco.
— Se a intimidação não bastar, me chamem. Eu resolvo.
Deixei a parte externa com os dois e entrei na loja. Lá dentro, o aroma do pão fresco era maravilhoso. Morin e as crianças estavam ocupadas na cozinha. Enquanto Morin e a filha assavam os pães, davam instruções às crianças, que faziam o melhor possível. Algumas com futuro promissor na panificação.
— Bom dia, senhorita! — Quando uma delas me notou, todas me cumprimentaram com energia… mas ainda assim pareciam cansadas. Morin e Karin já estavam acostumadas, mas os órfãos não. Provavelmente ficaram acordados até tarde preparando tudo, e estavam em pé desde o amanhecer.
Eles poderiam descansar depois que o pão estivesse pronto… mas como lidavam com fogo e óleo, não era seguro deixá-los trabalhando cansados. Caminhei até eles e coloquei minhas patas de urso sobre suas cabeças.
— Garota urso? —
Uma menina inclinou a cabeça quando toquei sua cabeça.
— Cura. Aguentem só mais um pouquinho.
Usei magia de recuperação de estamina em todos. Isso os manteria por mais um tempo, mas eles inclinavam a cabeça, sem entender o que havia acontecido. Após cuidar disso, fiz uma inspeção final na loja e voltei para fora, bem a tempo de ouvir Rulina explicando a situação para um cliente, que foi embora obedientemente.
— Tudo certo?
— Sim. Quando explico, eles vão embora — respondeu, fazendo sinal para Gil. — Gil ajuda.
— Só estou parado — disse Gil.
— Parado como uma montanha de músculos, meu caro.
— Hrm.
Sim, o cidadão comum não discutiria com um aventureiro.
— E quanto aos próprios aventureiros?
— Isso vai ser tranquilo. Digo, de quem é essa loja?
— Uhh, minha?
— Isso mesmo, Ursa Sangrenta. A loja é sua. Você nocauteou quase uma dúzia de aventureiros quando chegou na guilda, derrotou um rei goblin e liquidou uma víbora negra. Ninguém em sã consciência vai mexer com você. Se alguém tentar, será um novato ou forasteiro. E aí essa montanha aqui vai entrar em ação.
Ela apontou para Gil.
— Mmhm.
— Obrigada, pessoal. Podem comer o que quiserem assim que abrirmos.
Voltei para ajudar na cozinha, mas logo depois Rulina entrou com uma expressão preocupada.
— Yuna, posso te chamar um instante?
— O que houve?
— Uma jovem veio até aqui, e estamos tendo um pequeno problema.
Ela parecia nervosa. Jovem? Então era uma criança?
— Uma aristocrata.
Só uma pessoa me vinha à mente. E, de fato, quando fui verificar, lá estava ela: uma menininha loira discutindo com Gil. Claro.
— Por favor, deixem-me entrar. Tenho negócios com a senhorita Yuna!
— Aguarde. Estamos chamando ela agora — disse Gil, claramente desconfortável em barrar uma criança.
A jovem aristocrata era Noa.
— Noa, o que está fazendo?
— Yuna! — abriu um sorriso e virou-se para Gil e Rulina, furiosa. — Disse que queria ver você, mas esses brutamontes não me deixaram entrar!
— Pedi para eles cuidarem da loja, Noa. Fiquei impressionada que reconheceram você como aristocrata.
— Já vimos a jovem com o lorde várias vezes — explicou Rulina.
— E então, o que foi, Noa?
— O que foi?! Não pude vir antes por causa de assuntos extremamente importantes de nobreza, e quando finalmente venho… me deparo com isso! O que são esses ursinhos na entrada?!
— Conversamos sobre deixar a loja mais “ursosa”, lembra? Então… eu fiz.
Ela não tinha vindo desde que Lala a levou embora.
— Inacreditável que fez isso sem mim! — resmungou. — Enfim, estou aqui por pudim!
Com aquele sorriso desarmante, não consegui dizer não.
Levei Noa para dentro. Ao entrar, ela congelou.
— M-Mas o que é isso?! — exclamou ao ver os enfeites de urso. Então correu até mim e segurou minha patinha. — Por favor, faça isso na minha casa também!
— O Cliff literalmente teria um colapso.
— Eu vou convencê-lo! Faça em todos os cômodos!
— Calma, calma… por enquanto, se contente com isso.
Criei uma mini estátua de urso e entreguei para ela.
— Obrigada! Vou guardar para sempre!
— Nem precisa tanto…
Ela ficou encantada andando de enfeite em enfeite.
— Sim, decidi. Levarei todos eles, Yuna.
— Negado.
— E onde esteve, afinal?
— Estava atrasada nos estudos por causa da viagem à capital, então meu pai me colocou com um tutor.
— Faz sentido. Você não fez nada além de brincar por lá.
— Mas meu pai é cruel! Nem me deixa sair!
— Se não está estudando, ele não tem escolha.
— Ele podia ao menos me dar uma folga de vez em quando…
— Nesse caso, o pudim é por minha conta. Mas só se você estudar direito.
Noa se sentou, e trouxe para ela um pudim, uma mini pizza e suco.
— Já não era hora de abrir?
— Aconteceu uma coisinha…
Contei sobre o caos do dia anterior.
— Claro! Depois de provar seus pratos, até eu quero contar pra todo mundo!
— Mesmo assim, foi mais gente do que esperávamos.
— Yuna, você é tão ingênua… tão pura quanto seu pudim!
— Hã?
— Queria que tivesse visto o salão onde serviram seus pudins no aniversário do rei!
— O rei mencionou que muita gente queria saber quem fez o pudim…
— Naturalmente! Quando ele chegou, todos estranharam. Mas com a recomendação do rei, provaram. E aí virou um tumulto!
— Eu tô encrencada?
— Por quê estaria?
— Se descobrirem que vendo aqui, podem vir forçar-me a ensinar a receita.
— Vai ficar tudo bem. O rei mesmo pediu para meu pai proteger você. Se algo acontecer, vão dizer que esta loja foi aberta por ordem real.
— Sério?
— Foi o que meu pai disse. Mas finja que não ouviu isso de mim, por favor. Disseram que as guildas também foram instruídas.
Então era por isso que o mestre da guilda apareceu para comer…
— Com o apoio do lorde e da realeza, você não precisa se preocupar.
— Obrigada.
Conversamos por mais um tempo até ouvir um burburinho do lado de fora.
— O que é? — perguntei a Rulina.
— Disseram que iam esperar a abertura.
Justo. Faltava pouco para abrir.
— Rulina, pode organizar duas filas? Se alguém se exaltar ou tentar furar, avise.
— Tem certeza?
— Desde que não causem problemas. Só preciso das filas organizadas.
Enquanto isso, deixei o pessoal da loja descansar e comer. Quando abrimos, já havia trinta pessoas nas filas, mas com Rulina e Gil, tudo correu bem.
— Obrigada, Rulina, Gil.
— É nosso trabalho. Mas quero almoço, hein.
— Já está preparado.
Dessa vez, nada de caos. Os clientes formaram filas certinhas e fizeram seus pedidos enquanto o Monte Gil vigiava.
Pudins estavam limitados a um por pessoa. Mesmo assim, muita gente pediu pizza e hambúrguer. Era hora do almoço, afinal.
— Isso está delicioso — disse Rulina.
— Hrm. — Gil comeu em silêncio.
— Se quiserem mais, só avisar.
— O pudim é famoso, ouvi da Helen — comentou Rulina.
— É doce. Alguns homens não gostam.
— Tá bom — murmurou Gil. — Gostoso.
— Comer isso por uma semana é uma bela recompensa.
— Querem trabalhar aqui em tempo integral? Tenho muitas coisas para fazer.
— Tentador, mas ainda quero ser aventureira um tempo.
— E o Deboranay?
— Ugh. Estou pensando em me separar dele. Era pra ser temporário. E você, Gil?
— Não sei.
— Pode trabalhar aqui também.
— Não cozinho. Só luto.
— Ótimo. Pode cuidar da segurança. E ensinar os órfãos que querem ser aventureiros.
Alguns deles queriam isso por minha causa. Queriam “proteger o orfanato”, ouvi dizer.
Se precisassem de um lugar para trabalhar, eu criaria um para eles.
— Também quero que cuide das crianças quando eu sair da cidade. Tem muito trabalho pra você.
— Vou pensar.
Fiquei surpresa com a resposta.
— Sem pressa.
Nosso segundo dia passou sem problemas. Quem chegou tarde ficou sem pudim.
Ah, e Lala apareceu para levar Noa. Ela havia fugido dos estudos. Chorou, implorou… mas eu não ia me meter com Lala.