– AGORA É A MINHA VEZ! – disse Gentz, indo para o banho.
Nós quatro que sobramos começamos a nos enxugar. Secar o cabelo só com toalha ia demorar uma eternidade, então fui até meu quarto e voltei com um tipo de “secador mágico”. Usei magia da terra pra moldar algo no formato de secador e coloquei algumas gemas de fogo e vento dentro. Talvez alguém até vendesse algo assim por aí, mas seria um saco procurar nas lojas, então decidi fazer eu mesma.
– Fina, vem aqui um instante.
– O que você quer?
– Vira de costas e senta aqui.
Ela obedeceu direitinho e sentou de costas pra mim. Seu cabelo, que passava um pouco dos ombros, caiu na minha direção. Peguei o secador e canalizei mana nele. Uma brisa morna começou a sair.
– Eek! O que é isso?! – Fina deu um pulo, se virando.
– É uma ferramenta pra secar o cabelo soprando ar quente. – Soprei um pouco na mão dela pra mostrar que era seguro.
– Tá quentinho…
– Agora que você viu, vira de novo.
Fina obedeceu e virou pra frente. Quando terminei de secar o cabelo dela, passei pra Shuri, que tinha o cabelo um pouco mais comprido.
– Yuna – disse Tiermina –, esse negócio é bem útil, hein.
– Fiz porque é um saco secar cabelo longo.
– Quando terminar, posso usar também? – O cabelo da Tiermina ia até as costas.
– Claro. – Entreguei o secador pra ela quando terminei com Shuri.
– Tem certeza que posso ir antes de você? – ela perguntou. Meu cabelo ainda estava enrolado na toalha, seco só pela metade.
– O meu vai demorar. Pode usar tranquila.
– Então vou aceitar com gratidão.
Tiermina começou a secar o cabelo enquanto as filhas observavam. A cena era tão fofa e tranquila. Quando ela terminou e me devolveu o secador, Gentz voltou do banho.
– Que banho maravilhoso. Aqueles ursos me deram um baita susto, mas valeu, senhorita. – Gentz olhou bem pra mim… e travou.
– O que foi?
– Garota urso, você parece bem diferente sem o capuz.
– É mesmo?
– Eu não fazia ideia de que seu cabelo era tão comprido debaixo dele. Muda completamente a impressão.
Será que ele e a Tiermina estavam lendo as falas do mesmo script?
– Acho que você fica fofa com o capuz – ele disse –, mas com o cabelo solto, fica linda.
– Concordo totalmente! – disse Tiermina.
– Me elogiando assim não vai ganhar nada, viu?
– É um desperdício esconder um cabelo bonito desses.
Como não dava pra contar que eu era inútil sem meu pijama de urso, resolvi ficar quieta. Fina começou a me ajudar a secar o cabelo no meio do processo, e eu agradeci.
Quando terminamos, levei todos aos quartos de hóspedes.
– Gentz, você fica no quarto lá do fundo. Só tenho duas camas no outro quarto, pra Tiermina e as meninas, mas será que você pode pegar o que fica ao lado?
– Claro. Eu e a Shuri podemos dividir uma cama.
Olhei séria pro Gentz.
– Gentz.
– Oi?
– Nem pense em visitar a Tiermina à noite. Fina e Shuri precisam dormir.
– Eu nunca faria uma coisa dessas!
– E nem deixa ela te visitar, entendeu? Não quero ter que lavar lençol sujo.
– Eu também não ia querer que você fizesse isso!
– A gente jamais faria esse tipo de coisa na casa de outra pessoa – disse Tiermina –, ainda mais com as meninas por perto. De qualquer forma, estamos todos exaustos. Vou dormir. Muito obrigada por tudo hoje.
– Boa noite, Yuna.
– Boa noite.
– Também vou deitar. Você ajudou demais hoje. Valeu – disse Gentz, meio encabulado, e foi pro quarto dele.
Fui pro meu quarto também.
Na manhã seguinte, quando desci, encontrei Fina preparando o café da manhã.
– Bom dia – cumprimentei.
– Bom dia.
– Acordou cedo.
– Sempre sou eu que preparo o café da manhã pra minha família, então já fui adiantando…
– Não se preocupe com os ingredientes. O resto do pessoal ainda tá dormindo?
– O senhor Gentz… quer dizer, meu pai, foi trabalhar. Ele pediu pra agradecer você.
Ele tinha faltado alguns dias no trabalho pra correr até aqui enquanto a Tiermina estava doente, depois procurando casa, e agora com a mudança. Não dava pra continuar assim por muito tempo.
– A Shuri e minha mãe ainda estão dormindo.
– Deixa elas descansarem. Devem estar cansadas.
Apesar de eu ter curado a Tiermina, ela ainda estava recuperando as forças. Ter ficado tanto tempo na cama tinha afetado seu corpo, e a mudança também devia ter sido puxada.
– Tudo bem. A Shuri sempre dorme até essa hora, e minha mãe ainda não está acostumada a acordar cedo por causa da doença. Mas ela acorda quando vou chamar.
Ou seja, alguém tinha que ir acordar as duas.
– Terminei de preparar o café. Vou chamar as duas.
Fina subiu. Depois de alguns minutos, Tiermina e Shuri desceram, esfregando os olhos.
– Yuna, bom dia. Muito obrigada por tudo ontem.
Ela ainda parecia bem cansada. Shuri também estava meio grogue. Mesmo assim, começaram a comer o café preparado pela Fina: sanduíches simples de legumes com leite. Pensando bem, eu não comia um ovo frito desde que saí da Terra. Eu mataria por um sanduíche de ovo frito naquela hora.
– Fina, queria te perguntar uma coisa rapidinho.
– O que foi?
– Você sabe onde dá pra comprar ovos?
– Hã?
– Ovos. Fritar uns ovos e colocar no pão é a melhor coisa. Só que não vi nenhum lugar vendendo isso por aqui.
– Yuna, lojas normais não vendem produtos de luxo assim.
– Sério?
– Sim. Só nobres e algumas poucas pessoas ricas podem comer algo tão refinado quanto um ovo – explicou Tiermina. – Você tem que ir até a floresta pra coletar ovos, e se demorar, eles estragam. Então nem dá pra trazer de muito longe. Mesmo com um cavalo rápido, o preço seria alto demais.
– Uhh, não dá pra pegar umas aves que não voam e criar pra botar…
– Aves que não voam? Mas não são aves porque voam?
Talvez esse mundo nem tivesse galinhas? Ou talvez só não tivessem nessa região? Se eu procurasse, será que encontrava alguma? Adicionei “galinhas e ovos” à minha lista de ingredientes desejados.
Depois do café, os três voltaram pra casa pra terminar de arrumar as coisas da mudança. Me ofereci pra ajudar, mas recusaram.
– Você também tem que trabalhar, não tem, Yuna?
Na verdade, eu tinha dinheiro o bastante pra viver sem trabalhar por um bom tempo. Um sábio já disse: trabalhar é perder tempo. Mas mesmo assim, decidi ir até a guilda dos aventureiros ver os painéis de missões.